Com experiência de 14 anos em diversos setores da economia no setor privado e outros 11 na gestão pública, o economista Eduardo Neves assumiu há poucos meses a presidência da Agência de Desenvolvimento Econômico do Estado do Ceará (Adece), com o desafio de uniformizar procedimentos, melhorar a governança corporativa e adequar o funcionamento da instituição para o novo cenário da economia que se abre.
Com o novo padrão, as câmaras foram reduzidas de 28 para 21, aumentando a convergência entre setores que têm relação entre si, e houve uma padronização dos regimentos internos e manualização dos instrumentos de acompanhamento. Assim, cada uma das câmaras tem o compromisso de produzir um relatório de gestão por ano, com mapeamento de cada atividade, para que a Adece possa direcionar seus esforços para demandas filtradas por cada setor.
“A gente escutou bastante, viu o que o pessoal de cada setor queria e não queria, e fomos desenvolvendo a nova metodologia. Ao longo do processo, nós vamos ajustando a metodologia. Não é um modelo fechado. Tem que ficar sempre em aperfeiçoamento”, explica.
“Nestes primeiros meses, fizemos um trabalho de fortalecimento da instituição, de olhar pra dentro e melhorar a nossa produtividade, aperfeiçoando os processos”, resume o executivo, que antes de assumir a presidência, ocupou a Diretoria de Infraestrutura da Adece.
Você veio da iniciativa privada e passou por diversos setores, da construção civil à agropecuária, do granito à colchoaria, tanto como consultor, como quanto empresário. De que forma essa experiência ajudou a pensar políticas públicas de desenvolvimento econômico?
O choque é grande. A minha experiência foi como dono do próprio negócio, então o time e os trâmites são completamente diferentes. Antes, tudo dependia de uma decisão minha. Se ia acertar ou errar é outra história, mas estava resolvido. No setor público são muitos trâmites, as decisões seguem processos, você tem que tratar com muita gente, por isso é muito desafiador. Mas, acredito que, por causa da minha experiência anterior em muitos negócios diferentes e também como consultor, eu posso entender melhor a demanda de cada segmento, compreender a dinâmica de cada negócio e gerenciar melhor os processos.
A Adece, através do site invest.adece.ce.gov.br, oferece várias informações e a estrutura disponível em cada município do estado para atrair novos negócios. Você acha que os municípios têm utilizado essa ferramenta a contento?
O papel da Adece é apoiar e mostrar os caminhos que existem, considerando a vocação de cada município. A gente provoca para que isso vire, de fato, política pública. Mas, claro que isso depende de articulação do município.
Onde os novos negócios devem surgir nos próximos anos?
A infraestrutura que a trinca de hubs está a oferecer dá a oportunidade de trazer muitos negócios. O hub aéreo tem a vertente do turismo e da movimentação de cargas, já que a tendência é de ter aviões mistos. Somando os voos internacionais e o Porto do Pecém, o Ceará vai ser um concentrador de cargas, e viabilizar o aproveitamento de todos os modais é um tarefa nossa. No hub marítimo, a ZPE e o know how vindo de Roterdã, que está tornando o Pecém um porto mais eficiente e mais ágil, também vai gerar uma demanda grande de produtos e serviços para exportação. O hub tecnológico abre uma janela de oportunidades grande, para a gente pensar na indústria 4.0 e para o desenvolvimento de startups. Nós vamos estar com as condições criadas, agora cabe desenvolver o ambiente. Tanto que a Adece criou, recentemente, uma diretoria exclusiva pra isso: Inovação, Tecnologia e Saúde.
Essa diretoria está desenvolvendo também o Polo Industrial e Tecnológico da Saúde, em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz, no Eusébio?
Inicialmente estamos trabalhando no Polo do Eusébio, onde tem a unidade da Fiocruz e o @Porangabussu. Estamos buscando desenvolver esse distrito de inovação, visitando e trocando ideias com outros que já existem mundo afora, para adaptar às nossas demandas. A ideia é que esse modelo de distrito de inovação possa ser replicado depois, em outros setores.
A Adece também tem incentivado negócios de baixo impacto ambiental e a economia verde?
Outro foco da nossa atuação é o de energias renováveis, por conta do nosso potencial, que é nítido. Aqui, a gente tem a matriz completa: solar, eólica e biometano. São vários pontos da matriz renovável, e nós temos feito um trabalho para fortalecer essa cadeia também. Por exemplo, criamos um licenciamento simplificado para que o empreendedor participe do leilão. A gente vinha perdendo muito espaço por causa das licenças, e a gente simplificou o processo para que o empreendedor faça o licenciamento ambiental completo depois de ganhar o leilão.
A Adece instituiu duas novas câmaras setoriais, a Economia do Mar e Águas Continentais e a de Economia Criativa. Qual o potencial do Estado para ambas?
A da Economia do Mar e Águas Continentais nasce com duas temáticas: camarão e tilápia, mas a ideia é que surjam muitas outras. A economia do mar é muito rica para ser desprezada. A gente acredita que, no decorrer do ano, vamos amadurecer essas atividades e ver surgirem outras. A da Economia Criativa nasce com a temática da gastronomia, que vai conversar com todas as outras câmaras temáticas. É um universo muito grande e de muito potencial no Ceará. Envolve eventos, cultura, lazer, artesanato, turismo, e por aí vai. Vamos trabalhar esses setores profissionalmente e espero que tenhamos duas cadeias fortes no final do ano.
O agronegócio cearense, a despeito da seca, resistiu em grande parte devido à tecnologia aplicada. Qual o papel da Adece nesse sentido?
O agrobusiness é uma das nossas principais frentes de atuação, e nós aplicamos altíssima tecnologia na pecuária, na agricultura irrigada e na indústria leiteira. Fizemos um levantamento de todas as bacias do estado do Ceará para saber como potencializar o uso de cada uma, o que deve ser produzido em cada bacia para que gere o maior valor agregado, com o maior número de empregos gerados, e que consuma menos água. Essas são as nossas premissas para o agronegócio. Já testamos e aprovamos alguns produtos específicos, como a pitaya, por exemplo, que tem alto valor agregado e baixo consumo de água no cultivo, por ser uma cactácea. Estamos discutindo também a chegada das águas do São Francisco, para que a gente consiga garantir e ampliar a produção do agronegócio. É importante dizer que a gente acompanha todos os setores da economia, inclusive a indústria tradicional. A gente acompanha o setor têxtil, que é uma tradição local; o setor calçadista, que é o segundo maior exportador do País e gera mais de 56 mil empregos no interior. Então, a gente acompanha os setores e estuda as suas demandas para que sejam melhorados e ampliados.
Quais são as suas expectativas para a economia cearense em 2019?
Eu enxergo o ano de 2019 como de muitas oportunidades, graças à estrutura alcançada com os hubs e a rede de estradas e rodovias. Isso nos permite avançar mais na atração de novos negócios e na ampliação dos já existentes. A gente tem a favor a estrutura e a localização geográfica, a meio caminho da Europa, da África e da América do Norte, e cada vez mais estamos buscando melhorar a ambiência dos negócios.
Você vê a possibilidade de fusão entre os bancos federais de financiamento, como Banco do Nordeste, BNDES e BASA, como empecilho para essa melhoria buscada no ambiente de negócios?
Temos que ver como será feita essa fusão. Hoje, o Banco do Nordeste é o melhor instrumento de financiamento que nós temos para desenvolver a região. Se for para melhor o crédito, com certeza é bem vindo. Mas não podemos criar muita expectativa, o governo Bolsonaro ainda é uma grande incógnita. A gente não sabe como vai se compor esse cenário, mas estamos fazendo a nossa parte.
O governador Camilo Santana e o futuro governo pertencem a campos políticos opostos. Você acredita que o componente político vai afetar a captação destes tão desejados novos negócios?
O que a gente imagina é que vai ser um governo para todos os brasileiros. O governador Camilo Santana vai negociar, como sempre tem feito. Ele é um homem de fácil diálogo e as propostas do estado do Ceará são claras, são oportunidades que temos aqui. Se o empreendedor enxergar, o frete onera muito os negócios e nós somos um ponto logístico fantástico. A um raio de 1,5 mil km temos Belém e Salvador, estamos falando de uma população de 70 milhões.