Considerado um dos principais retratistas da atualidade, o fotógrafo Bob Wolfenson fala ao O Otimista sobre a carreira e a felicidade de compartilhar seus conhecimentos através de workshops e palestras, como fez no Museu da Fotografia Fortaleza no último fim de semana
Danielber Noronha
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O luto pela a perda do pai e a necessidade de se manter na maior cidade do País fizeram o paulistano Bob Wolfenson se aventurar pelas lentes da fotografia. Com apenas 16 anos, ele jamais imaginava que se tornaria no futuro um dos principais retratistas da contemporaneidade, tendo fotos publicadas nos principais veículos editoriais no Brasil, com exposições em equipamentos culturais nacionais e internacionais, além de vários livros publicados. “Nem no meu sonho mais delirante eu poderia imaginar. Mas não digo só em relação a ser bem sucedido, é muito mais no sentido de que a fotografia se tornou algo muito visceral para mim”, afirma o fotógrafo ao O Otimista.
De passagem pela capital cearense, Wolfenson ministrou, no último fim de semana, o workshop Retratos, no Museu da Fotografia Fortaleza (MFF) – local onde também expôs seus registros em mostra recente e que abriga uma das maiores coleções particulares de seus trabalhos. “Este museu é algo fabuloso, um sonho e já se inscreve no mundo como um dos principais centros de exposição, difusão e discussão de assuntos ligados à linguagem fotográfica”, destaca.
Nesta entrevista exclusiva, o retratista fala sobre a experiência de trabalhar com o cearense Chico Albuquerque, considerado o precursor na publicidade nacional, além de destacar alguns momentos importantes da carreira, dando, ainda, seu olhar sobre a importância de equipamentos culturais para ampliar o letramento cultural das pessoas e também sobre como a fotografia tem sido vista em tempos de selfies e smartphones.
.O Otimista – O que te fez escolher se aventurar pelo universo da fotografia?
Bob Wolfenson – Foi uma contingência. Meu pai morreu quando eu tinha 16 anos. Precisei trabalhar e o emprego que arrumei foi de aprendiz no estúdio fotográfico da Editora Abril, à época dirigido pelo Chico Albuquerque. Seu Chico, como o chamávamos.
O Otimista – O senhor começou no ramo com pé direito, sendo dirigido pelo Chico Albuquerque, considerado um pioneiro na publicidade nacional. Pode resgatar como foi a experiência e o que mais aprendeu com ele?
Bob Wolfenson – Ele era muito rigoroso, digo no sentido da excelência com o trabalho, e, curiosamente, sua família era muito presente no estúdio, a filha, o filho, a esposa e o sogro. O que dava um tom informal à toda aquela estrutura da Editora Abril. Mas eu era um menino de 16 anos com muitos interesses além do que via lá. Talvez, não tenha aprendido o que poderia ter aprendido com ele. Muitos anos depois, quando eu já era, então, um fotógrafo conhecido, ele já havia se aposentado, estava morando em Fortaleza e veio dar um pulo em São Paulo, aproveitando para me visitar junto com o Ricardo, seu filho. Foi um encontro lindo. E me disse com seu charmoso sotaque cearense: ‘mas rapaz, você que só fazia atrapalhar (referindo-se à experiência minha como aprendiz) chegou até aqui. Fico muito feliz’.
O Otimista – Como foi o processo de se perceber como uma referência na área em que escolheu atuar?
Bob Wolfenson – Acho que isso, normalmente, vai acontecendo sem percebermos. Não localizo muito um ocorrido que tenha me feito, como você diz, uma referência na área.
O Otimista – Em qual momento surgem os nus artísticos? Havia algum receio de entrar nesta vertente da fotografia?
Bob Wolfenson – Os nus, às vezes nem tão artísticos assim… Nunca senti medo disso, pelo contrário, fui me oferecer para fazer. Na época era para o mercado editorial, bem pago e com grande visibilidade.
O Otimista – Para além das fotos de retrato, publicidade, nudez e moda, vieram também os ensaios de cunho social, observando o cotidiano urbano, a violência, dentre outras temáticas. Como foi se colocar nesses lugares?
Bob Wolfenson – À parte de minha atividade profissional, que é feita de pedidos e encomendas, sou um cidadão que se interessa por seu entorno e época. Venho de uma família muito politizada e que me ensinou a olhar para as questões sociais de uma forma humanista e ativa. Estes trabalhos foram e são frutos dessa formação e de observações sobre a vida contemporânea.
O Otimista – O senhor iniciou a carreira muito cedo, ainda na adolescência. Lá no início, imaginou que chegaria tão longe?
Bob Wolfenson – Nem no meu sonho mais delirante eu poderia imaginar. Mas não digo só em relação a ser bem sucedido, é muito mais no sentido de que a fotografia se tornou algo muito visceral para mim. Foi através dela que fui por aí, encontrar lugares e pessoas que jamais pensei que pudesse. É através dela que me expresso mesmo quando é um trabalho profissional. Adoro uma frase do grande fotógrafo norte-americano Garry Winogrand: ‘Fotografo pra ver o mundo e as coisas fotografadas’. Me representa.
O Otimista – E o que diria, com a experiência de hoje, para aquele jovem que está iniciando uma jornada de muito sucesso?
Bob Wolfenson – Não se deslumbre.
O Otimista – Agora, avançando um pouco na linha do tempo, como surgiu a ideia de criar o Workshop Retratos?
Bob Wolfenson – Comecei a ser procurado por muita gente que queria cursos meus, palestras e tal. Achei que nessa altura da vida seria legal e fiz alguns. Em certo momento, resolvi determinar o formato e produzir isso com a minha equipe em São Paulo. E tem sido muito auspicioso! Agora, resolvemos ousar, porque este workshop é uma performance com projeção de meus trabalhos e interação com a audiência. Então, como fazem os músicos e as cias. de teatro, vamos fazer um tour pelo País. Fortaleza, foi o ponto inicial, pois é onde tem o Museu da Fotografia, dirigido pelo Silvio Frota, que abriga a maior coleção de retratos meus, e por ser um lugar que adoro, onde fiz uma linda exposição. Depois Rio de Janeiro, São Paulo de novo. Também estamos negociando outros centros.
O Otimista – Pode detalhar um pouco de como é este momento de aprendizado?
Bob Wolfenson – É uma projeção sobre minha carreira com vídeos e fotografias e história acopladas às imagens, com um debate entre os participantes e este que vos responde. Também doamos meu último livro a cada participante, O Livro Falado.
O Otimista – Hoje, vivemos o tempo dos retratos rápidos, selfies e smartphones com câmeras de alta qualidade. No olhar do senhor, isto é bom para a fotografia ou pode acabar apagando a figura do fotógrafo profissional?
Bob Wolfenson – É bom e ruim. Bom porque a fotografia passou a ser uma linguagem quase como a escrita, todo mundo fotografa e há um interesse grande pelo assunto. A questão da memória ficou acessível a todos. Qual família carente tinha fotos dos seus entes queridos desde a infância? Hoje isto é possível. No entanto, o fato de haver uma certa naturalização pelo excesso, a fotografia nem mais é percebida como tal e nunca houve tantas fotos ruins como as fotos ruins de hoje. Assim como todo mundo escreve, poucos são os escritores. Todo mundo fotografa, poucos são os fotógrafos, pois para sê-lo são necessários os mesmos quesitos que um escritor precisa: ideias, técnica, estilo e um pacto com sua audiência. Atrás de uma câmera tem que haver alguém pensante com conceitos e veleidades documentais, jornalísticas e/ou artísticas.
O Otimista – O seu workshop foi no Museu da Fotografia Fortaleza, espaço que recebe exposições, cursos e oficinas gratuitos. O que o senhor acha de equipamentos e iniciativas com vistas à democratização do acesso à fotografia?
Bob Wolfenson – São fundamentais para o desenvolvimento de um olhar, de uma cultura e, obviamente, de um mercado. Este museu é algo fabuloso, um sonho e já se inscreve no mundo como um dos principais centros de exposição, difusão e discussão de assuntos ligados à linguagem fotográfica. Iniciativas como museus, centros culturais, exposições, debates, workshops e publicações (livros, zines e revistas) colaboram para criação de uma massa crítica em torno da fotografia.