Análise da obra e show musical homenageiam Belchior no aniversário de sua morte

Em encontro virtual nesta sexta-feira (30), dia em que se completam quatro anos da morte de Belchior, três especialistas conversam sobre a obra do compositor cearense. Outra homenagem é o show com artistas locais cantando clássicos de sua obra   

Naara Vale
naaravale@ootimista.com.br

“Eu não estou interessado em nenhuma teoria / Em nenhuma fantasia, nem no algo mais / Nem em tinta pro meu rosto, ou oba-oba, ou melodia / Para acompanhar bocejos, sonhos matinais”

 Os versos de “Alucinação”, canção que dá nome ao segundo disco de Belchior (lançado em 1976), são o ponto de partida para uma conversa sobre a obra do compositor cearense. Projeto da Escola Porto Iracema da Artes, o “Anatomia da Canção” ocorre nesta sexta-feira (30), às 17h30, dia em que se completam quatro anos da morte de Belchior. O encontro será transmitido ao vivo pelo YouTube da Escola.

Com mediação de Mona Gadelha, coordenadora do Laboratório de Música do Porto Iracema das Artes, o bate-papo vai reunir a pesquisadora Josy Teixeira, que tem mestrado e doutorado sobre Belchior, o músico e escritor Léo Mackellene e Nirton Venâncio, poeta e diretor de cinema, que está produzindo um documentário sobre o Pessoal do Ceará.

Além de prestar uma homenagem a Belchior, a live vai tomar como base a letra de Alucinação para falar da vasta obra deixada por Belchior. Para o poeta Nirton Venâncio, diferente do que costuma ser a ideia do projeto, que “disseca” uma canção, filme ou espetáculo, seria impossível se ater apenas a uma música de Belchior. Não porque faltaria assunto, muito pelo contrário.

“Para mim, é impossível falar de Alucinação, só da música, sem falar da obra como um todo. Do primeiro ao último disco, Belchior fez uma letra só. Todas elas emendam uma na outra porque são um recado só. E todas falam em primeira pessoa: é sempre eu, eu. Mas é um eu que fala do geracional, não é do individualista”, destaca Nirton Venâncio.

Amar e mudar as coisas

Diferente de outros compositores da sua geração, como Caetano Veloso, Chico Buarque e o próprio Fagner (seu conterrâneo e parceiro), a obra de Belchior esteve por um período latente, especialmente após os anos 2000, e pouco alcançou as novas gerações. Seu autoexílio, todas as incógnitas que vieram com ele e a sua morte repentina, além da acessibilidade permitida pelas plataformas de streaming, voltaram a despertar a curiosidade e o interesse do público sobre a obra do cearense.

Um reconhecimento, porém, muito aquém da magnitude das canções de Belchior. É o que acredita a pesquisadora Josy Teixeira, que estuda a obra do cearense desde 1999. “A obra de Belchior pode ser colocada ao lado das melhores obras de nosso cancioneiro, de Chico Buarque, de Noel, de Gonzagão. Sim, seu trabalho é um dos mais profundos da história da música brasileira. Mas para que o ouvinte e leitor possam identificar essa qualidade, é necessário que se conheça os diversos textos com os quais Belchior dialoga. E isso não é tarefa fácil”, aponta a estudiosa.

Ouvinte do cantor desde a infância, Josy conta que duas características principais chamaram sua atenção para a obra de Belchior: a abordagem de temas não trabalhados em outras obras musicais e o diálogo de suas letras com outras obras musicais, literárias e filosóficas, as quais o público precisa conhecer para conseguir dar sentido às canções do cearense. “Nas músicas nós encontramos, desde João Cabral de Melo Neto, Drummond, Fernando Pessoa, Dante, até Noel Rosa, Chico Buarque, Gilberto Gil, Bob Dylan, os Beatles”, diz a professora.

As referências, ora são homenagens a esses artistas, ora são críticas. Como exemplo, ela cita um trecho da canção que vai ser trabalhada na live de amanhã, “Alucinação”, na qual Belchior alfineta a fase mística de Raul Seixas. “No verso ‘Eu não estou interessado em nenhuma teoria / (…) / Romances astrais’ aparece uma referência à canção de Raul ‘Trem das Sete’: ‘(…) Ói, olhe o mal, vem de braços e abraços com o bem num romance astral / Amém’”, explica a pesquisadora. “Nós encontramos esse embate também nos versos de ‘Baihuno’: ‘Fosse eu um Chico, um Gil, um Caetano, e cantaria, todo ufano: os Anais da Guerra Civil’”, que confrontam de uma só vez três dos maiores artistas da música brasileira”, completa Josy.

Com mais de mil páginas escritas sobre Belchior, a pesquisadora diz que ainda há muito a ser desvendado sobre o legado do compositor. “Considero que a obra do Belchior é especialíssima na produção musical não só brasileira, mas mundial, e traz uma natureza que precisa ser mostrada, discutida, prestigiada”, aponta. “A obra de Belchior no universo da música brasileira é caracterizada por uma singularidade (é única!) e pode ser analisada em várias perspectivas, do ponto de vista das letras (extensas e discursivas), da maneira de cantar (extremamente nasalada e tipicamente nordestina), da forma e do conteúdo das canções”.

Serviço
O que: Projeto “Anatomia da Canção” analisa obra de Belchior no dia em que sua morte completa 4 anos

Quando: sexta-feira (30), às 17h30
Onde acessar: Canal do Youtube do Porto Iracema das Artes

 

 

Belchior em todos os Tons

 

A Secretaria Municipal da Cultura de Fortaleza (Secultfor) realiza, nesta sexta-feira (30), show musical em homenagem a Belchior, reunindo diversos artistas locais para cantar os clássicos do compositor cearense. O show ocorre no Teatro São José, com transmissão às 19h30, no canal da Secultfor na plataforma de vídeos Youtube e na TV Terra do Sol (42.1).

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