Com desfile icônico no SPFW, Lino Villaventura fala de inspirações e autenticidade na moda

No São Paulo Fashion Week, Lino Villaventura transformou a passarela em um cenário apocalíptico, com looks que misturam artesanato e futurismo. “Originalidade é o que dá identidade”, diz o estilista em entrevista exclusiva ao Tapis Rouge, que traz detalhes da novíssima coleção apresentada por ele no evento

Catharina Maia e
Sâmya Mesquita
samyamesquita@ootimista.com.br

Em um mundo onde a moda muitas vezes se repete, Lino Villaventura prova, mais uma vez, que originalidade é o traço que nunca sai de moda. O estilista paraense com raízes cearenses mostrou no São Paulo Fashion Week N59 uma coleção que mistura distopia, artesanato e muita ousadia.

O espetáculo da destruição (e da criação)

Com telões cheios de nuvens tempestuosas e looks que pareciam saídos de um filme apocalíptico, Lino transformou a passarela em um cenário de cinema. Peças em camadas — desde polainas até agasalhos estruturais e vestidos estruturados — dominaram o desfile, enquanto materiais inusitados, como algodão rústico, palha e até pele de cobra em patchwork, reforçaram a narrativa de um futuro distópico. E tudo isso saído de sua mente brilhante, que busca em sua própria vivência a manifestação da originalidade. “Não existe uma inspiração que eu consiga identificar, porque senão me limita, me torna engessado”, reflete o estilista, em entrevista exclusiva ao Tapis Rouge, que também marcou presença na SPFW N59. “A inspiração de qualquer pessoa criativa é a própria vida; são as coisas que te emocionam, que são intrigantes”. E convenhamos: intrigante é praticamente o codinome dessa coleção.

Logo no início, uma série de looks brancos — marca registrada do estilista desde os anos 2000 — mostrou o domínio de Lino em cortes e nervuras, agora acrescidos de bordados com pérolas e tecidos de acabamento rústico. Mas, como sempre, o colorido não ficou de fora: tons florestais de marrom, verde e roxo apareceram em vestidos fluidos, enquanto peças esculturais ganharam mosaicos de tecido, como no vestido de Carmelita. Apesar de ser um show para quem assiste — quem viu o último desfile dele no DFB sabe —, a arte apresentada tem o objetivo de transcender delimitações. “Passarela não precisa ser teatral e minimalista: tem que ter um conceito importante, um propósito”, defende Lino. E ele provou que o seu propósito e de suas coleções é, definitivamente, surpreender. O designer ainda apresentou roupas perpassadas por tiras, fivelas e balaclavas, com pérolas negras que imitavam tachas de metal.

Já na moda masculina, o streetwear urbano ganhou destaque com a cor cáqui e sneakers. Tudo culminando na série final toda em preto, que destaca a tridimensionalidade das criações. Mas será que Lino é movido por tendências na criação dessa arte? Claro que não! “Tendência do momento é passageira, passa logo. A assinatura fica”, afirma. E é essa assinatura — repleta de artesanato, ousadia e histórias — que faz dele um dos maiores nomes da moda brasileira.

Legado que inspira

Antonio Marques dos Santos Neto começou na moda quase por acaso, ainda em Belém. Ao lado de amigos, criava roupas para sair à noite, em uma brincadeira que logo se transformou em paixão. A mudança para Fortaleza, acompanhando os pais, foi o ponto de virada que o levou a se estabelecer como estilista. Em 1982, quando iniciou oficialmente sua carreira ao lado de Inez Villaventura, o cenário da moda brasileira ainda estava preso à reprodução de tendências internacionais. Lino, com um olhar vanguardista, destacou-se ao propor um trabalho genuinamente autoral, que inicialmente causava surpresa e curiosidade, mas rapidamente conquistou respeito.

Diferente da maioria dos estilistas, Lino não utiliza croquis como base de criação. Sua técnica é intuitiva e artística: ele coloca o tecido sobre a mesa, corta-o em pedaços, manda bordar — já chegou até a aplicar cristais Swarovski —, finaliza os acabamentos e, por fim, monta a peça. Essa abordagem artesanal resulta em criações únicas, com nervuras, plissados, texturas, volumes geométricos e assimetrias que se tornaram sua marca registrada. Mesmo em peças mais simples, como o clássico “pretinho básico”, sua identidade autoral está sempre presente.

Lino já vestiu personalidades como Xuxa, Taís Araújo e, mais recentemente, a cearense Nataly Rocha na première do filme Motel Destino, no Festival de Cannes. É essa habilidade de mesclar inovação e tradição que o mantém no topo da moda autoral, sendo uma referência de qualidade e criatividade.

Originalidade é tudo

Se tem uma lição que Lino deixa é que moda vai muito além de tendências. “O verdadeiro tapete vermelho é daquelas pessoas que têm originalidade no trabalho. Tem muita gente que tem coragem de fazer algo original, e é isso que dá identidade e dá um estilo próprio ao profissional”, diz. E, depois de uma coleção como essa, fica claro: a identidade desse cearense de coração é inconfundível e insubstituível.

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