Romance, musical e comédia se combinam de forma cativante em O Melhor Amigo, novo longa do diretor cearense Allan Deberton, que estreia nesta quinta-feira (13). O cineasta e os atores Gabriel Fuentes e Vinicius Teixeira detalham ao Tapis Rouge os bastidores da produção
Onivaldo Neto
onivaldo@ootimista.com.br
E se durante uma viagem para uma praia paradisíaca uma paixão do passado ressurgisse, colocando certezas à prova? Essa situação complicada e instigante é a premissa de “O Melhor Amigo”, longa-metragem que marca o retorno do cineasta cearense Allan Deberton após o prestigiado “Pacarrete”, de 2019. Com toques de humor, o romance musical LGBTQIAPN+ entra em cartaz nesta quinta-feira, 13, em todos os cinemas do país. Além de dirigir, Deberton também assina o roteiro da produção, ao lado de Raul Damasceno, Otavio Chamorro e Pedro Karam. O filme conta ainda com participações especiais da atriz Cláudia Ohana, da cantora Gretchen e do ator Mateus Carrieri.

Enredo
Em busca de um refúgio para aliviar a frustração com seu relacionamento, o arquiteto Lucas, interpretado por Vinícius Teixeira, decide viajar sozinho para a incandescente Canoa Quebrada, em Aracati, no litoral do Ceará. No local, no entanto, o protagonista se depara com mais do que belas paisagens e reencontra uma antiga paixão da faculdade, Felipe, encenado por Gabriel Fuentes. Diante de sentimentos antes adormecidos, questões mal resolvidas do passado e novas possibilidades para o futuro, Lucas embarca em uma jornada de autoconhecimento, buscando redescobrir a si mesmo e explorar novas perspectivas sobre o amor e a vida. Tudo isso embalado por números musicais envolventes de composições consagradas dos anos de 1980 e 90, além de outras referências mais atuais.
O início
Antes de ganhar forma em longa-metragem, a relação entre Lucas e Felipe foi retratada em um curta homônimo de 2013, também dirigido por Allan Deberton. Em entrevista exclusiva ao Tapis Rouge, o diretor revela que o desejo de realizar a versão estendida da narrativa surgiu logo após a repercussão e recepção positiva da produção, à época estrelada pelo ator Jesuíta Barbosa (Praia do Futuro, 2014). “Os usuários [da internet] comentavam que o curta parecia parte de um longa e que parecia estar faltando cenas. Se conversava sobre a necessidade de esticar a história e eu fiquei com isso na cabeça.“
De início, nos primeiros tratamentos de roteiro, “O Melhor Amigo” estava inclinado a ser um drama romântico, no entanto, segundo o cineasta, a vontade de inserir músicas que marcaram os anos de 1980/90 e a percepção de como essas canções atendiam a narrativa e representavam os sentimentos dos personagens fizeram com que a película tomasse outro rumo. “Veio a ideia de substituir essas músicas por cenas. A gente começou a entender que o filme poderia se tornar um musical. As músicas estavam contando uma história, que é uma regra fundamental de musical, quando músicas são narrativas”, detalha Deberton.
Novas abordagens
De maneira geral, tem se observado uma mudança em relação à representação e protagonização de casais LGBT’s em produções para cinema, TV e streaming. Até pouco tempo, histórias com a de Lucas e Felipe eram quase que exclusivamente retratadas em dramas densos com finais infelizes. Porém, com avanços e conquistas importantes, além de uma motivação mercadológica, produtos audiovisuais com uma perspectiva mais positiva e leve, protagonizados por personagens LGBT’s, têm ganhado cada vez mais força.
Questionado sobre o assunto, Deberton discorre: “Eu acho que porque já foi feito muito cinema nesse lugar mais pessimista e dolorido. Existia um lado político de representar a dor, as questões, os dilemas (…) enfim, tem um monte de questões que eu acho que existia; e ainda existe a necessidade de ser debatido. Só que esse cinema, no qual a orientação sexual é uma questão, já é um assunto resolvido. Não precisamos mais colocar em cheque num filme se eu posso ser gay ou se eu não posso ser gay”, sucinta.
Fugindo desse lugar-comum, “O Melhor Amigo” se destaca como um exemplo desse cinema que explora novos gêneros e assuntos. “O que a gente está falando no filme é sobre questões mais miúdas. Assim, é mais dentro do campo do afeto, da intimidade do romance, que é geral. Com todos, para todas as pessoas do mundo assim. Por exemplo, o personagem do Felipe, a gente não discute se ele é gay, se ele é bi… ele é o que ele é”, elucida Deberton.
Os protagonistas

Os atores Gabriel Fuentes (“Malhação”, 2018) e Vinicius Teixeira (“Justiça 2”, 2024) vivem o casal de protagonistas do longa cearense. Na trama, os personagens dos artistas são nativos, nascidos em Fortaleza, porém os atores têm raízes no sudeste do país. Para se prepararem, Fuentes e Teixeira chegaram à capital cearense pouco antes das filmagens. “A gente ficou um mês nesse processo de ensaio. Estudamos as músicas, passamos os tons, aprendemos as coreografias, enfim, estudamos as encenações. Foi um processo que a gente teve tempo de se sentir seguro para fazer”, rememora Vinicius.
A experiência de trabalhar em um produto como “O Melhor Amigo”, até então, era inédita na carreira de ambos, que precisaram se aventurar por novos desafios, ao explorarem habilidades em canto e dança, além da atuação. “Foi minha primeira experiência atuando, cantando e dançando. Eu estava começando a fazer aula de canto e não imaginava que esse projeto iria chegar nesse momento e aí foi maravilhoso. Como atores, ter essa oportunidade de cantar e dançar, além de atuar, é um sonho”, revela Gabriel.
Já ao falar sobre as características que compõem o seu personagem, Gabriel afirma que encontrou diversas semelhanças, que o ajudaram, inclusive, com questões pessoais. “Eu acho que o Felipe tem muito do Gabriel e o Gabriel tem muito do Felipe. Acredito que quando o personagem chega para gente, já existe muito dessa persona cheia de camadas. O Felipe me ajudou muito com a minha autoaceitação também, como pessoa e com a minha sexualidade também. No fundo, ninguém é 100% bem resolvido. Todo mundo tem suas questões, preocupações e camadas”, reflete.
A experiência de Vinícius com o seu personagem no longa também se assemelha com a de Gabriel. O ator relata que antes mesmo de viver o protagonista em tela, já havia se identificado com ele ao assistir o curta homônimo de 2013. “Vi que tem muito do Lucas em mim, e vice e versa. Mas esse lugar de identificação que eu tenho com o personagem (…) vem de uma coisa que faz parte da realidade do mundo LGBT de uma forma geral. A gente cresce aprendendo a se esconder, a esconder nosso corpo, nossos trejeitos, o jeito de falar, acaba ficando muito racional, pensando muito em tudo. (…) eu acho que vem desse lugar que eu também reconheço em mim e que luto para me libertar”, expõe.
Talentos locais
Além de contar com artistas globais e conhecidos do público, o elenco de “O Melhor Amigo” também é formado por um grande número de atores e atrizes cearenses, como Solange Teixeira, Patrícia Dawson, Walmick de Holanda, Gabriel Arthur e Adna Oliveira. O casting de talentos locais é completado por Dênis Lacerda (Deydianne Piaf), Souma, Muriel Cruz e Rodrigo Ferrera (Mulher Barbada). Na produção, os personagens das artistas são responsáveis por momentos cômicos e emocionantes, com números musicais. Na vida real, as profissionais são destaques na cena LGTB+ fortalezense, tanto por seus trabalhos artísticos como suas vozes em prol da comunidade.
De acordo com Allan Deberton, as artistas foram consideradas para o longa já na construção do roteiro. “(…) já existia tanto a Gretchen como a própria trupe do que era o coletivo As Travestidas. Eles eram meio que parte do DNA do filme. A ideia era realmente fazer esse convite e trazer eles para emprestar seus talentos, porque de fato são artistas incríveis, que fazem um trabalho muito multifacetado. O Dênis já fez audiovisual várias vezes e dentro desse filme eu achava que havia chance de dar um pouco mais de espaço dele em cena. A Mumu, que é a Muriel e a Souma foram achados. A gente foi reconstruindo a história já considerando todos eles e todas elas”, relembra.
O futuro
Nem sempre um último ato significa o encerramento de uma história. Com um desfecho que proporciona ao público diversas interpretações e possibilidades, “O Melhor Amigo” deixa o caminho aberto para uma possível sequência. Allan deixa claro que há o interesse de continuar escrevendo o romance. “Vontade sempre tem. A gente faz um cinema brasileiro para emocionar, que vai para festivais e que gera debate. Mas, ao mesmo tempo, eu acho importante a gente [também] fazer cinema para o público, por vezes despretensioso, onde a gente também possa brincar com o gênero, que é o caso de ‘O Melhor Amigo’”, pontua.
Com o engajamento recorde de público no cinema brasileiro causado, principalmente, por recentes lançamentos de grandes obras como “Auto da Compadecida 2” e a vitória inédita de “Ainda Estou Aqui” no Oscar, a expectativa é que os próximos lançamentos nacionais performem bem em termos de bilheteria, como corrobora o cineasta. “Eu acho que esse movimento que a gente tá tendo, gerado pelo ‘Auto da Compadecida 2’, ‘Ainda Estou Aqui’, e diversos outros filmes recentes, está trazendo o espectador para o cinema de uma forma muito automática e sincera. (…) Então, se a gente tiver sorte de o filme atrair esse público no qual ele deseja, a gente espera que, sim, com certeza vai haver ‘O Melhor Amigo 2’, ‘A Melhor Amiga’, ‘Minha Amiga é Um Amigo’. Tudo é possível!”, brinca o diretor.
mais
Assista ao trailer:
serviço
Filme “O Melhor Amigo”
Estreia nesta quinta-feira (13)
Classificação 16 anos